«Dar Voz aos Afetos…»
Na cinzenta e chuvosa manhã do dia 13 de fevereiro, Florbela Espanca, William Shakespeare, Carlos
Drummond de Andrade, Eça de Queirós
e Fernando Pessoa iluminaram a nossa
biblioteca, pela mão e pela voz dos sete mais recentes e corajosos elementos da
Trupe Leal Conselheiro, dinamizada,
como é sabido, pela alquimista e professora Ana Paula Santos.
À sua espera, encontravam-se os alunos do 9.º A, 9.º B e 9.º C.
A expectativa
era grande…
Que
bom foi ver e ouvir «A quadrilha»,
na deliciosa versão das alunas do 9.º C
Clara Albino, Érica Pontes, Maria João
Silva e Renata Cardoso…
Conheces o texto?
Quadrilha
João amava
Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para o Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para o Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.
Carlos
Drummond de Andrade
E que
dizer da bela leitura encenada de um excerto da obra Romeu e Julieta, de
William Shakespeare?
O Pedro Marta, aluno do 10.º C da ES D. Duarte,
deu-nos a conhecer um outro Eça, lendo este excerto
de uma carta do autor à sua futura esposa:
Cada Dia que Passa me Aproxima de Si
Bom!
Recebo neste instante a sua carta escrita à luz de uma só vela - e tenho de
retirar tudo, tudo, tudo o que escrevi! Pois acabou-se! Não retiro. A minha
querida dizia no outro dia que devíamos mostrar um ao outro todos os estados de
espírito em que tivéssemos estado. Mostro-lhe, assim, que estive hoje, ontem,
antes de ontem num estado de impaciência por uma palavra sua, gemendo e
queixando-me de «ne voir rien venir». E mostro-lhe assim o desejo de ter todos
os dias, ou quase todos, um doce, adorado, apetecido e consolador «petit mot».
[...]
E foi
mesmo Florbela em pessoa que nos brindou com a sua presença e nos fez felizes…
[...] Tu
tens-me feito feliz, como eu nunca tivera esperanças de o ser. Se um dia alguém
se julgar com direitos a perguntar-te o que fizeste de mim e da minha vida, tu
dize-lhe, meu amor, que fizeste de mim uma mulher e da minha vida um sonho bom;
podes dizer seja a quem for, a meu pai como a meu irmão, que eu nunca tive
ninguém que olhasse para mim como tu olhas, que desde criança me abandonaram
moralmente, que fui sempre a isolada que no meio de toda a gente é mais isolada
ainda. Podes dizer-lhe que eu tenho o direito de fazer da minha vida o que eu
quiser, que até poderia fazer dela o farrapo com que se varrem as ruas, mas que
tu fizeste dela alguma coisa de bom, de nobre e de útil, como nunca ninguém
tinha pensado fazer. Sinto-me nos teus braços defendida contra toda a gente e
já não tenho medo que toda a lama deste mundo me toque sequer.
Florbela Espanca, Correspondência
(1920)
E
vejam só este espantoso Fernando Pessoa…
e o
que ele nos leu:
Bebezinho do Nininho-ninho
Oh!
E também tive munta pena de não tá ó pé do Bebé pâ le dá jinhos.
Oh!
O Nininho é pequinininho!
Hoje o Nininho não vae a Belem porque, como não sabia s’havia carros, combinei tá aqui às seis o’as.
Amanhã, a não sê qu’o Nininho não possa é que sahe d’áqui pelas cinco e meia (1) (isto é a meia das cinco e meia).
Amanhã o Bébé espera pelo Nininho, sim? Em Belém, sim? Sim?
jinhos, jinhos e mais jinhos
Hoje o Nininho não vae a Belem porque, como não sabia s’havia carros, combinei tá aqui às seis o’as.
Amanhã, a não sê qu’o Nininho não possa é que sahe d’áqui pelas cinco e meia (1) (isto é a meia das cinco e meia).
Amanhã o Bébé espera pelo Nininho, sim? Em Belém, sim? Sim?
jinhos, jinhos e mais jinhos
Fernando
(1) No original, há aqui
o desenho de uma meia.
Terminámos
em beleza, pela mão do Pedro Bento, aluno do 10.º C ,
e do Fernando Santos, aluno do 12.º C, que nos garantiram que só quem
nunca escreveu cartas de amor é que é ridículo…
Todas as cartas de amor
Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.
Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.
As cartas de amor, se há amor,
Têm de ser
Ridículas.
Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.
Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.
A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.
(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas.)
Fernando Pessoa
Os aplausos foram
mais do que merecidos!
Muito
obrigado e muitos parabéns a todos!
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